segunda-feira, 29 de abril de 2013

DUETO ( IN MEMORIAM ) < Martinez & Eugénio de Sá - O Milagre da Praça... >




O MILAGRE DA PRAÇA...

José Geraldo Martinez

Pombinhas da praça São João
distraem o olhar do menino...
Daquelas vizinhanças, por certo!
Perdido entre elas,
assusta-se ao tocar dos sinos!

Todos os dias era assim,
ficava ali observando...
O tempo lhe era generoso!
Até que, ao seu redor,
todas fossem se juntando.

Tratava-as com carinho,
apesar do vigário!
Sujavam as escadarias da igreja,
para o azar de padre Olegário!

Engraçado! Num dia que ninguém esperava...
Ele abriu os braços todo contente e,
às vistas de toda aquela gente,
o garoto com elas voava!

Sobrevoa a igreja, levita
ao céu de puro azul...
Ao olhar das incrédulas pessoas!
Junto ao bando, qual anjo...
O menino voa!

Até sumir nas alturas do céu sem fim...
Neste instante, rompe a chuva
por sobre a cidade,
abrindo um arco-íris em leque multicor,
trazendo o vento com cheiro de jasmins!

O que não sabiam todos
era o que havia sucedido:
um dia antes do fato - acreditem -
o menino havia morrido!


"Para estarmos ao lado do Pai,
não é preciso bagagem alguma,
apenas termos a alma pura de uma criança."

(José Geraldo)
Brasil – 2007



O Milagre da Praça

(Eugénio de Sá responde
ao seu amigo José Geraldo Martinez)


Um anjo, aquele menino dessa praça
que as mansas pombinhas recebiam
e voando com ele todas queriam
ganhar de Deus essa suprema graça:

A graça que dos céus é recebida
p'los seres que deste mundo tão perdido
sabem dar-se a si próprios um sentido
que casto, dê sentido às suas vidas

E essa alminha que Deus mostrou ser Sua
e ergueu nos ares com as mansas pombinhas
vestiu de luz as outras almas nuas

Dela ficou perfume de jasmim
a pairar na Praça de São João
porque o odor do amor é mesmo assim.

Brasil – 2007


       Arte: Lina P. Salatino


domingo, 28 de abril de 2013

FOI UM QUASE CHEGAR de Eugénio de Sá & Um quase chegar... Regina Coeli

Foi um quase chegar…

Eugénio de Sá

Era c'o um “se” que sempre me afastavas
Sempre um “talvez” travou a nossa vida
Eu, mal chegava, já estava de partida
Tu, hesitante em dizer que me amavas.

Tangemos ao de leve a felicidade
Nunca a soubemos ver como possível
Pois sem um forte crer não será crível
Que d'incertezas nasça uma verdade.

E assim, ao rés do amor fomos andando;
- Era estar preso ao cais mas sem amarras -
Tu, parecendo anuir, sempre adiavas
Eu, sempre mil entraves vislumbrando.

Pra ti,  foi só um bem…que suportavas
Pra mim, quiçá prazer…que fui levando
- Foi um quase chegar, nunca alcançando -
Pra nós foi um voar privados d’asas!




Um quase chegar...
Regina Coeli
(voando na bela inspiração do poeta Eugénio de Sá)

Pobre daquele que provou o “talvez”,
A dúvida com travo de agonia
Da noite mística envolvendo o dia
Ensombrecidamente sem porquês...

Ao longe os cantos, um de cada vez,
Ecoaram à despedida da alegria
Na partitura a se vestir sombria
De notas com requinte de mudez.

O que é estender a mão... e não pegar,
E ainda sorrir da sorte onipotente
De sentir dentro o amor... sem desfrutar?

Ó noite, faz de mim um alguém contente:
Dá-me um beijo com hálito de luar
E deixa o sol cobrir-me ardentemente...

Cartas de alforria
Escritos de Regina Coeli
 Brasil - 2013


Veja em vídeo com @rte do amigo Dorival Campanelle







TRÊS POETAS PORTUGUESES JUNTAM-SE PARA INTERPRETAR O MOMENTO DIFICIL PORQUE PASSA A SUA PÁTRIA

TRIETO - EUGÉNIO DE SÁ / ANTÓNIO BARROSO (TIAGO) / HUMBERTO SOARES SANTA


Como morde este cão!



Eugénio de Sá



Eu vim de longe viver em ti desgraças

Terra que amei e venerei demais

Ora, em meu peito passam vendavais

Por em ti ver fuçarem gentes baças



Aqui ressuscitou a violência

Alternados poderes a proclamaram

Pla força da mais vil omnipotência



Fechamo-nos nos medos que tememos

Obrigam-nos a tudo o que não queremos

Plo pavor do abismo, assombração



Como morde, sem dentes, este cão

De raça amaldiçoada, que vilão

Habita no canil onde o pusemos?



Rio de Mouro (Sintra),

Portugal

14.Abril.2013





O grande circo



António Barroso (Tiago)



Oh! Minha pátria amada, de Vieira,

Agora dominada pela ambição,

Não és o tal país, a tal nação,

Que andou a descobrir a terra inteira.



A fome é uma ameaça verdadeira,

Mas há, por outro lado, a corrupção

Que acumula, milhão após milhão,

E se escuda na crise financeira.



E a classe dirigente nada faz,

Porque a não deixam, ou não é capaz

De acabar com o roubo, o cambalacho.



No parlamento, a farsa é encenada,

Parece que se matam à pancada,

Mas vão todos comer ao mesmo tacho.

  
Parede (Cascais),

Portugal

14/04/2013


Cidade Grande



Humberto Soares Santa



Ando perdido na grande cidade

Procurando, sem rumo, a minha rua.

Quando encontro uma Rua da Verdade,

Vem sempre alguém dizer que a rua é sua.



A Rua da Verdade não existe.

Dos homens é lembrança do passado.

O coração aperta e fico triste

Quando os vejo a passar por outro lado.



Cidade grande que já foi aldeia

Onde a verdade era nua e crua.

Agora os lobos reúnem a alcateia



Pra caçar presas. Não uivam à Lua.

O homem colhe aquilo que semeia

E eu…não tenho mais a minha rua!



Cotovia(Sesimbra), Portugal
14/04/2013


Visualização e edição:
Imagem: As Fúrias, de William Bouguerou
som: Fado da Tristeza (parcial










quinta-feira, 25 de abril de 2013

Portugal , 25 de Abril de 2013 - A recente cronologia da desgraça - Eugénio de Sá


25 de Abril de 1974 – 25 de Abril de 2013
(  Faz hoje 39 anos que aconteceu a Revolução dos Cravos )
* cinco anos, escrevi: 
Nobre Povo

(Eugénio de Sá)

E foi Abril nas faces confiantes
De um punhado de jovens capitães
Foi também um sorriso em tantas mães
Que estremeciam tristes e errantes

Foi a glória nas ruas e nas gentes
Ao ver tombar o ferrete odioso
Sem que uma gota de sangue valoroso
Fosse em vão derramada a sangue-quente

Depois foi liberdade desfraldada
Com alegria, com cravos, com palmas
Até esgotar-se o dia noutra madrugada

Descansou o país, a paz fez-se nas almas
Que jamais esta pátria libertada
Perca, na indignidade, a justa calma

A Portugal

Escrito no Brasil
em 25 de Abril de 2007



* Poucos meses depois, escrevi:

Pedir a um português que não fale do mar,
que apague as brumas que lhe bordam os sonhos,
que esqueça as fomes de longe, as sedes de azul,
e que ignore a salgada e hídrica força da sua matriz,
é retirar-lhe a poesia das veias,
exilando-o num cais onde só há chegadas.


Quilhas no lodo
(Eugénio de Sá)

Quilhas sedentas d’água e tombadas
Naufragadas nos lodos de uma ria
São bolores de uma mágoa assaz sombria
Marinhagens de sonhos, desgraçadas

Porque é preciso navegar-se a vida
Acordar nas bravuras de uma proa erguida
E anoitecer num fado que nos dê guarida.

Viver a nostalgia desses horizontes
Onde a glória do sol emerge lentamente
Saber saborear as cores do seu poente.

É feito disto o sonho português;
De areias d’oiro e um mar de navegantes
E não de lodos vis, agonizantes,
Em negação a tudo o que se fez.

A Portugal
Agosto de 2007





* Quatro anos volvidos, achei que tinha de perguntar-me:



Portugal,

que te fizeram?



(Eugénio de Sá)



Lembro de em fim de tarde ir repousar

Debaixo de um carvalho ancestral

Falava então comigo, e ao falar

Só me saía um nome: Portugal !



Pode o nosso país nos causar dor

Plo que fizeram dele à revelia

Dos seus diletos filhos, que em amor

Mesmo os distantes, lhe sofrem a agonia



E esses, inconformados e descrentes

Vivem as mágoas de tantos irmãos

Que lá, por desditosos ou doentes

Esperam, em vão, ajuda de outras mãos



E assim morre na praia toda a esperança

Que nos foi impingida há tantos anos

Inda temos bem viva na lembrança

Toda essa verborréia só d’ enganos



Mas talvez nós sejamos os culpados

Ao nos deixar levar por tanta treta

Porque ao invés de castigar, irados,

Quem pôs o socialismo na gaveta,

Mais votos lhes somámos, alienados !



A todos os que já deixaram esta pátria bem-amada

e a sentem no sangue, como eu.



E.S.

Bogotá Colômbia

Março de 2011

* Vejamos agora o que escrevi a este respeito em 2012:


25 de Abril



Comemorar que revolução? - Sim, a pergunta põe-se,

porque não comemos… liberdade, nem com ela pagamos as contas!
  • Trinta e oito anos depois da 'Revolução dos Cravos' - que encantou o mundo - pela primeira vez, os homens que a levaram a cabo nas ruas de Lisboa, fizeram público que não iriam participar nas cerimónias habituais das suas comemorações. A mesma afirmação ouvimo-la na boca de políticos que a história consagrou como mentores da liberdade, à cabeça dos quais está Mário Soares e o seu amigo e correligionário, o poeta Manuel Alegre.
    “Digam a quem governa o que lhes vai na alma”, disse-o Miguel Portas, um homem cuja boca se calou para sempre, precocemente, em Antuérpia, longe do seu Portugal, que ele sempre amou e serviu com o grande coração que tinha.
  • Pois bem, se nós o disséssemos, tería de ser para, em primeiro lugar,  pedir contas aos tantos que nos levaram à situação em que hoje, lastimavelmente, o nosso pais se encontra; à beira da banca rota, de mão estendida à espera que lhe vão chegando os milhões pedidos emprestados. Gente incapaz, alguns mesmo desonestos, que se instalaram no poder mais para servir os amigos e a si próprios, que para servirem realmente a cousa pública, de acordo com o juramento que fizeram quando formalmente tomaram posse dos seus cargos à frente da nação.

    Em democracia, só há uma forma do povo dizer que este não é o caminho; é através do voto. É com este papelito que o povo pode - e deve - castigar aqueles que se propuseram criar-lhe melhores condições de vida e que, ao invés, o levaram à falência. Mas sem soluções alternativas credíveis não cabia aos portugueses poder alterar este estado de coisas e assim se foram mantendo interminavelmente no poder aqueles que hoje são responsáveis pela situação a que chegámos.

    Solidários, os três partidos dominantes, dois dos quais responsáveis alternados pelos vários governos depois do 25 de Abril de 1974, juntaram-se há um ano atrás naquilo a que chamaram "um amplo consenso nacional, que a pátria exigia" para que ganhasse credibilidade o indispensável cumprimento das regras que o Fundo Monetário Internacional, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia impunham para que nos fosse garantido o empréstimo de cerca de 74 mil milhões de euros, que se diziam suficientes para equilibrar as contas públicas e pagar o empréstimo do dinheiro, com juros substancialmente inferiores aos do mercado, então anormalmente altos por efeito da nossa baixa classificação anunciada pelas empresas norte americanas de “rating”.
    Entretanto, os elementos que constituem a Troika, iniciavam as suas regulares visitas a Lisboa para analisar a situação e posteriormente controlarem e fiscalizarem “in loco” se a “generosidade” das instituições que representam está e continuará  a ser devida-mente compensada e  acautelada.
    Precisamos de ganhar competitividade, esse é segredo para sair da crise, diz a Troika, e repetem em coro os nossos governantes. E para isso há que baixar salários, afirmam. Mas é um facto que já estamos abaixo da média europeia em mais de 50% . Já em 2011, o custo médio por hora de trabalho em Portugal atingiu os 12,10 euros, um valor que, comparado com a média de 27,60 euros na restante zona do euro, prova isso mesmo (dados revelados pelo Eurostat).
    Acresce, que as tais regras obrigam a grandes reduções nas 'despesas do estado', mormente a uma estagnação dos salários, e a despedimentos ditos amigáveis, mesmo que colectivos. A aumentos nos transportes, nos impostos, directos e indirectos, nos custos ao consumidor da electricidade, da água, do gás, etc, etc, o que faz que rapidamente os portugueses estejam agora a perder (em média) cerca de 273 euros por ano, relativamente aos anos imediatamente anteriores ao tal “generoso” empréstimo a três anos.
    E o resultado de tudo isto é um dramático aumento do desemprego e uma assinalável redução nos movimentos da nossa  economia, uma vez que o consumo interno baixou drasticamente, como seria de esperar. Por outro lado, o estado passou a cobrar menos impostos e a ter de desembolsar mais dinheiro através da Segurança Social, para responder ao pagamento de mais subsídios de desemprego e outras contribuições que a crescente crise veio a obrigar.
    E, como o dinheiro não nasce do chão, têm vindo a ser estudadas medidas para minorar mais custos ao estado, que estão a sacrificar os portugueses e a levá-los a impensáveis níveis de empobrecimento, além de retirar-lhes muitos dos  direitos adquiridos, mormente aos pensionistas e reformados, os do estado e os do regime geral - até aqui sempre diferenciados - e agora todos metidos  no mesmo saco por obscuras, porque mal explicadas, conveniências.
    É sabido que os trabalhadores do estado e os pensionistas vão ver já este ano e até 2015 ( pelo menos ) desaparecerem os subsídios dos seus 13º e 14º mês, medidas estas que ainda está por saber-se se são ou não inconstitucionais ( e foram mesmo consideradas inconstitucionais, como se veio a saber depois ).
    É também sabido que as reduções orçamentais em todos os Ministérios vão, a curto prazo, obrigar a mais despedimentos - cujas regras também estão a mudar para muito pior para os trabalhadores. Estas medidas também fazem parte do ganho de competitividade, dizem "eles".
  • Outros cortes na despesa estatal  dizem respeito a reduções de custos nos transportes, na saúde, na educação e em muitos outros sectores da vida nacional, e, necessariamente, irão traduzir-se, ainda e sempre, em mais despedimentos e em pior serviço à população.
    Nesta altura, o desemprego formal já ultrapassou os 16%, a percentagem mais alta da UE, só inferior à que se regista na vizinha Espanha, e na Grécia.
    E os jovens à procura do primeiro emprego são já 37% do total de disponíveis para o efeito, o que fez o primeiro ministro sugerir a via da emigração como solução, imagine-se!
    A tudo isto há que juntar a quase paralisação da Banca - entretanto a tentar capitalizar-se - no que diz respeito ao indispensável financiamento às empresas, que viram limitar-se, em muito, a sua actividade, entetanto já muito sacrificada por esta crise. Acresce a este rol a real e praticamente completa paragem na construção civil, a maior empregadora. Na realidade, se não há quem compre o muito que existe para venda, para quê construír mais? - E o mesmo se passa com a venda de viaturas, reduzida a 50%.
    E aí está configurada a conjuntura da desgraça para a qual  o cidadão comum não contribuiu e a que assiste espantado e preocupado, porque está em causa a sua sobrevivência e a das suas famílias, muitas delas já endividadas e outras já completamente dependentes dos apoios públicos e/ou particulares que lhes possam fazer chegar um prato de sopa. Por tudo isto, e pelo que se adivinha que mais aí virá, perguntamo-nos: e o que vai o país comemorar em 25 de Abril?
    A pergunta é pertinente, pois sendo esta a data em que há 38 anos tudo foi prometido aos portugueses, estes vêm agora confirmada a sua vocação de continuarem a ser pobres, dos mais pobres de uma Europa, cujos padrões de vida lhes estão cada vez mais longe.

    Eugénio de Sá
  • ( bacharel em Economia

    * Por tudo isto, há bem poucos dias escrevi:

    Como morde este cão!

    ( Eugénio de Sá)

    Eu vim de longe viver em ti desgraças
    Terra que amei e venerei demais
    Ora, em meu peito, passam vendavais
    Por em ti ver fuçarem gentes baças

    Aqui ressuscitou a violência
    Alternados poderes a proclamaram
    E todos os direitos já ceifaram
    Pla força da mais vil omnipotência

    Fechamo-nos nos medos que tememos
    Obrigam-nos a tudo o que não queremos
    Plo pavor do abismo, assombração.

    Como morde, sem dentes, este cão
    De raça amaldiçoada, que vilão
    Habita no canil onde o pusemos?

    A Portugal
    14 de Abril de 2013
  • * E finalmente hoje, dia 25 Abril de 2013, limito-me a dizer:



    Os portugueses vestiram-se definitivamente de inverno.
    Por mais que o sol brilhe e os aqueça, nada há que lhes tire já
    o frio do coração!

    Eugénio de Sá




    Viva Portugal!

    Levante o som e ouça, na integra: *Grândola Vila Morena*, uma interpretação fabulosa de



    Zeca Afonso, o poeta e o cantor da revolução